sábado, 30 de janeiro de 2010

O despertar da primavera

Nympheas - Monet


Clarice sonhava amanhãs. Entrava na adolescência. Sabia que era espantoso defrontar-se com as inéditas manifestações curvilíneas de seu corpo. Um espanto alegre, fabricado na contemplação dos seus olhos verde-água, lânguidos diante do espelho de sua primavera. Um olhar mais demorado aqui e a descoberta de um contorno a mais, outro ali e a grandiosa descoberta das descobertas. Susto, cócegas e delicadeza se afinavam como um piano para um concerto maior.
Clarice carregava amanhãs em seu dia. Sonhava futuros na paixão da descoberta. Sorria diante de seus enigmas, suas feminilidades. Não, nada a amedrontava, pois nutria desde menina o sonho de um grande amor. Suzana, sua melhor amiga, já havia lhe contado como havia sido o primeiro beijo com língua. O frêmito da descrição só fez suscitar em Clarice o encontro por vir.
No verão viajou com seus pais para Paris. Lá era inverno e ela ia pela primeira vez pisar na neve. Despediu-se da amiga que ainda teve tempo de contar-lhe mais uma ou duas aventuras nos braços de Diego, o que só lhe aumentou o encanto da paixão revelada.
No Museu Marmottan Monet, encantou-se com o impressionismo e com o olhar de um rapaz não muito mais velho do que ela. O primeiro movimento foi de fechar-se em dobras, protegendo-se sobre seu próprio corpo, mas bastou que ele sumisse numa outra sala, para que ela retomasse o desejo correspondido.
"Mãe, posso andar por aí?", perguntou excitada Clarice, querendo saber mais sobre aqueles olhos azuis que haviam demorado o tempo de provocar um calor desconhecido no inverno daquele corpo.
"Claro filha, mas não saia do museu".
Clarice entrou na sala onde estavam Pisarro, Sisley e um Renoir. Sentou-se diante da tela de duas meninas num barco. Estava no encanto de descobertas, quando uma mão pousou suave, mas firme sobre seu ombro direito. Num susto ficou de pé. Era ele. Era ele a menos de um metro de distância. Sorriu sem graça achando que já havia ido longe demais. Seu peito arfava sem conseguir esconder o brilho de seus olhos. Ele era o menino mais bonito que ela já havia visto.
-"Parle tu français?"
Diante da negativa com a cabeça, ele a tomou suavemente pela mão e a conduziu por uma sala, depois outra. Parecia saber por onde se movimentar e ela simplesmente deixava-se arrastar pelo desejo. Num corredor que ia dar no toilette, ele parou e encostando-a contra a parede e olhando fixamente dentro dos seus olhos, a enfeitiçou com um beijo que lhe molhou todo o corpo. Suas pernas tremiam e enquanto ela não conseguia pensar em nada, só sentir o inexplicável da paixão, ele com mestria, abriu-lhe o casaco, levantou-lhe a blusa, roçou com a língua o contorno da auréola de seu seio esquerdo e mordiscou o entumescido desejo. Deu-lhe outro beijo em sua boca e saiu com extrema rapidez. Ela custou a se recompor. Saber onde estava e o que tinha acontecido parecia-lhe impossível. Transbordava em sentimentos inaugurais. Uma lágrima feliz rolava em seu rosto sem saber o motivo ou sequer o nome.
Foi ao banheiro e ficou uma eternidade olhando-se no espelho. Levantou novamente a blusa como que querendo reencontrar o nome da deliciosa ardência que ficara em seu seio. Passou com leveza sua mão sobre aquela parte tão sensível de seu corpo. E sorriu sem saber. Apenas sorriu para si mesma. Sentia uma sensação inexplicável. Uma parte de seu corpo agora lhe era muito íntima, mas estranhamente, parecia não mais lhe pertencer. Saiu correndo do banheiro e já no corredor deparou-se com sua mãe. Estava aflita. A mãe, é claro. Clarice já andava em nuvens de primaveras. Seus amanhãs.
-"Onde você estava?", disse a mãe entre raivosa e aliviada.
-"Tive vontade de ir ao banheiro". Era quase mentira, era quase verdade.
Clarice adiantou-se aos passos de sua mãe, mas não o encontrou. Nem ao menos sabia seu nome, ou e-mail para trocar correspondências.
Seus lábios haviam provado da existência da vida. Era uma provação que a vida lhe fazia. Provação sem respostas é abismo em primeira instância. Foi o que sentiu. Passear por Paris havia perdido o encanto do novo. Seu único olhar era para tentar reencontrar o calor em seu corpo descontínuo. Ele inaugurara em seu corpo o mistério do desejo e, seria por muito tempo, o impressionismo inscrito em sua pele. Ele era seu Renoir. Deu este nome para ele. Aquele rosto, aquela boca, aquelas mãos precisavam de um nome.
Só não conseguiu nomear o que sentia. Apenas, em sua saudade, dizia para si mesma que agora tinha uma alegria-triste.

6 comentários:

Unknown disse...

impressões inscritas na pele sem explicações ou definições... que gostoso é isso!
beijos

Renata Vilanova disse...

lindo!

Anne M. Moor disse...

Experiências de vida que marcam a caminhada! Adorei...

Bjos
Anne

Sônia Silvino (CRAZY ABOUT BLOGS) disse...

Carlos!
Aproveitei o domingo à noite para vir ler o teu post mais recente!!! Muito bom!
Bjkas!

Camila disse...

Lindo texto!Gosto da idéia de "não saber nomear o que sentia"!Muitas vezes eu realmente não sei nomear o que sinto..:)

Beijos!

Anônimo disse...

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