terça-feira, 29 de setembro de 2009

palavras



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"Ele disse que sabia sem as palavras como disse que a mãe ia morrer sem palavras". Enquanto agonizo - W. Faulkner
Fiquei assim, estático, ao ler estas palavras, ou melhor, a falta delas. Porque as palavras me completam, mas nem sempre. Muitas vezes são elas, justamente elas que me faltam e, assim fazendo, me descompletam dando-me sibilos de felicidade. Presença por ausência, diz-se. São como deuses: quando surgem me atordoam, mas quando se ausentam, desamparo-me. Neste momento ando por cristaleiras, por assim dizer. Finos cristais envolvem minha garganta. Não, não se apresse em querer socorrer-me, pois não estão a me cortar, por um fio pensaste. Apenas uma certa dificuldade em deglutir cacos de palavras. Gostaria de tê-las por inteiro, mas se soubesse como conseguir já não seriam as mesmas palavras, seriam sempre outras. Por isso me apaixono pela delicadeza de algumas delas, mas outras, um estorvo. As que cortam nem sempre são as mais precisas. Necessidade não é desejo. As mais imprecisas são aquelas que a gente sabe menos, mas em compensação são as que a gente mais usa. Garfo e faca, por exemplo, são palavras utensílio, mas que me descem mal. Hoje gostaria de deglutir silêncios, silêncios rodeados de palavras. O silêncio de uma frase me colocaria num profundo êxtase, um tobogã de possibilidades vertiginosamente deliciosas. Gosto disso, de me deixar escorregar em palavras aeradas. As palavras com menos chocolate causam profunda angústia. E a angústia é da ordem de uma terrível certeza: uma certeza sem saber algum. A angústia é o impronunciável da palavra. Um nome sem som é como uma casa sem vogal: inabitável. A angústia é a palavra desabitada por mim.

11 comentários:

Anne M. Moor disse...

A angústia são as palavras that throttle us.

Tens uma maneira fantástica de usar as palavras... Parabéns!

Beijos

Anônimo disse...

Deserto. Precisas do silêncio do deserto?
Imagina um só para ti.

VIRGINIA L. DE PAIVA MELLO disse...

"...as palavras as vezes cortam, um estorvo..."

Eugenia Ribas Vieira disse...

Carlos
Gosto muito das palavras em que você habita. Com o tempo acho que a angústia sempre procura palavras para habitar - ela não se sustenta inerte. Espero que sua angústia as achem.
Eugenia.

cristinasiqueira disse...

Carlos ,
Em cada palavra um sonar sinaliza caminhos para a alma percorrer e se entender.
Usa as palavras para dizer o que nem sempre se consegue dizer.E diz.
E que jeito forte,preciso e belo de dizer.

Com admiração,

Cris

Telma Miranda disse...

"estilhaçar o silêncio em palavras é um dos meus modos desajeitados de amar o silêncio, e é assim que muitas vezes tenho matado o que compreendo. (Se bem que, glória a Deus, sei mais silêncio que palavras.)" Acordei com Clarice um acordo de silêncio. Mas concordo com Eugenia: a angústia, apesar de nos deixar inermes, nos move (s)em direção às palavras. E temos que nos haver com isso, pois o diabo é que "o que atrapalha ao escrever é ter de usar palavras."
Telma Miranda

celeal disse...

Um recado para Anne, Adriana,Virginia,Eugênia, Cristina e Telma:
pois é, tenho andado um pouco pelos meus silêncios e desertos. Obrigado pelas palavras. Acolho, neste momento, os sons iluminados que elas me trazem.
Com carinho,

Rosemary Q.(Miguxa) disse...

Olá Carlos!

Ás vezes, temos que juntar os cacos de uma determinada "coisa", para seguir os nossos caminhos.
Às vezes,tenho a impressão que me faltam palavras e a angústia toma conta de mim.Aí,então,as fotografias, as imagens, as músicas, as cores falam mais alto e me tocam profundamente, elas me acalmam e tudo se renova.

Caramba!Você escreve e se expressa maravilhosamente bem.
Seu texto é profundo,tocante e emocionante.

Carlos,parabéns pelas composições no seu blog e principalmente, pelo seu livro "A Última Palavra."

Ah!Gostei da sua entrevista na Leda Nagle(05/10/09),acredito que o seu livro será um sucesso absoluto.Boa sorte!

Boas leituras e uma ótima semana.
Rosemary Q.

celeal disse...

Olá Rosemary,
Super obrigado pelo carinho das suas palavras. Bom que você tenha gostado do programa, porque eu mesmo ainda não (me) assisti...rs. Você tem razão quando diz que as outras formas de manifestação artística (ah, a música, sempre ela) nos faz respirar quando a vida parece um deserto sem algumas de nossas conhecidas Veredas. Mas, às vezes o novo pode ser assustador, mas é essencial!
Volte sempre por aqui,
Com carinho e a emoção pela sua leitura,

Unknown disse...

Professor,
Estou sem palavras... rsrs...
Abraço.

celeal disse...

K. Cristina,
... rs
outro abraço.
Ps: Obrigado pela sua visita aqui, volte sempre!