sábado, 17 de junho de 2017

No sítio do meu vô




João Luis não sabia o que era o amor. Sua mãe avisou que não era negócio seguro não. Pegava, virava ao avesso e depois deixava assim na grama sem desvirar feito jabuti. Achou engraçado porque gostava de desvirar jabutis. Tinha lá seu quinhão de sabedoria e alguma astúcia ao fazê-lo. Seu vô disse: o retorno do vento no rosto é garantia de enamoramento. Se nos olhos entrasse poeira, areinha que fosse, e lacrimejasse, era amor na certa. O certo é que João Luis tinha uma árvore que era só sua. Ficava lá no mais alto dos morros do sítio. Assim: havia um descampado, e no meio do nada do capim, brotava imensa, majestosa e com copa suficiente para abrigar o menino e sua enorme imaginação. Da sombra assentada sobre o capim, sombra que balançava e voava nas horinhas do dia, João Luis sentava e fertilizava amores por aquela árvore. As raízes eram o prolongamento de suas ideias e seus braços esticavam tanto que faziam cosquinha do verde das folhas com o azul do céu. De lá avistava o mundo. Diante de seus olhos descortinava um vale e vez por outra, algumas vacas e inúmeros passarinhos. O amor por aquela árvore havia fisgado nos olhos e na carne macia de sua alma. Reciprocidade e reconhecimento não eram nomes ditos pelo avô Chico, mas era sentimento que transbordava sem carecer de palavras. Dizem que até hoje, face enrugada, olhos cansados de marejar a vida, o menino ainda aparece por lá naquele amor só dele. Amor endoidecido de menino pela natureza nunca careceu de razão não senhor.

Carlos Eduardo Leal

Nenhum comentário: