domingo, 29 de maio de 2011

A busca pela poesia


Queria ter a sensibilidade para a poesia. Queria ter forças para cruzar o Brasil, atravessar o atlântico e deitar portug-ais. A ideia mínima é esdrúxula e, por isso, meu braço pequeno. O mundo tão grande, as palavras descobridoras nascem com o primeiro galo a cantar infinitos. Descubro que a poesia não me cabe. Eu, tão pequeno, para estrofes drummondianas. Preciso elevar a palavra a outros patamares, cantá-la como se canta um fado, mas não sei nenhum fado. Sei que ele é triste e, que quando colocamos um "r", transforma-se num peso impossível de carregar. Ah, letras pequenas que não cabem numa frase. Ah, estrofes. Por que me enganas? Por que não rimas a meu favor? Canto. Sim, canto auroras e desconheço razões. Canto saudades e perco-me sobre balcões nobres que se debruçam sobre palcos vazios. A festa havia acabado, disseram-me. Perdeste o espetáculo! Mas, o que era? Ah, era um sábio que declamava versos feitos no calor do momento. Um trovador? Um repentista? pensei.
De um salto, pulei o balcão para dentro do palco. No chão ainda haviam algumas letras não usadas. Palavras incompletas, frases mallarmaicas. Jogos de dados ao acaso. Cuidadosamente e, com reverência, me agachei para, uma a uma, enfiá-las no bolso da minha calça. Talvez sejam partes de uma poesia. Talvez seja estrofes não declamadas...reclamadas? Ou odes à mulher amada.
Caminhei para fora do teatro. Estava quase sem mim. A noite engolia-me por inteiro. De verdade, só a silhueta da sombra por companhia. Ouvi um barulho. Pensei que me seguiam. Parei e ouvi novamente uma voz. Então, percebi. Vinha de dentro de mim. Pouco a pouco fui retirando do bolso da calça aquelas palavras que, misturadas à minha, ganhavam voz. E o mundo descortinava uma canção feita de amanhãs em poesias: aos poucos foram abrindo as janelas da cidade. E as pessoas olhavam para as palavras que passeavam por entre as calçadas e adentravam os edifícios.
Naquela manhã, a poesia habitou corações. E a cidade foi se iluminando de cores como há muito não se via. Quem saía de casa ganhava a rua sorrindo, contagiando crianças, estudantes, pobres, noivas, motociclistas, anônimos escravos do asfalto.
Naquela mesma manhã, com o coração aos pulos, mergulhei no atlântico para atravessá-lo e encontrar Fernando Pessoa.
A poesia havia me salvado.

4 comentários:

Leitores do Mira disse...

Edu, acabo de ler "Poemas concebidos sem pecado", novo livro de poesias de Manoel de Barros, e me deparo com seu texto. Sintonia fina! A poesia me salva também!
Lindíssimo texto.
Bj
Adri

Raquel Amarante disse...

SENSACIONAL!
Disso você já deve saber...
Só pra não esquecer...

Anônimo disse...

Carlos Eduardo

A poesia é o caminho ao nosso interior. As palavras que nos levam pela mão para uma reinvenção criativa!

beijos
Anne

Melissa Morgana disse...

Olá

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