Tudo está por um fio. Sempre se está em perigo. Alberto Giacometti
A paixão pelo inacabado.
Desde que o conheci, ando sofrendo de Giacometti. Eu sou um destes traços, esquálidos, quase indefiníveis, que testemunham desaparições. Restos. Sou a tinta que se esvai numa compulsão frenética, apaixonada, como quem não consegue terminar a obra. Sempre por fazer. Sempre por acabar. Inconclusa. In-finita. Jean Genet disse que suas obras só poderiam sair de um lugar. De um lugar de onde não se volta: da morte. Sombras, vultos, corpos em magreza-de-movimentos. Mas, com uma força de levantar todos os mortos de seus sonos atávicos.
Sim, estou, estamos nas esculturas e pinturas de Giacometti. Somos ossos, sempre a nos restar. Somos traços nervosos como no retrato de James Lord (primeiro da esq. p/ a direita na segunda fileira). J. Lord, o crítico americano foi visitá-lo em Paris e faria uma entrevista com ele. Giacometti se ofereceu para pintar seu retrato. Lord adorou a ideia. Escreveria sua matéria e ainda ganharia um quadro de ninguém menos do que Giacometti. Pois o pintor não conseguia acabar de pintar seu rosto dizendo que era impossível capturar a alma humana. E J. Lord dizia que ele era um mestre exatamente em capturar em suas pinturas a essência da alma humana. James Lord tinha ido passar uma semana e já estava lá há um mês. No dia seguinte a cada tentativa, Giacometti apagava obsessivamente o rosto e o repintava. Tendo observado isto, J. Lord passou a fotografar em segredo todos os quadros antes que Giacometti voltasse para apagá-lo. Lord não escreveu uma matéria para sua revista. Escreveu um livro com todas as fotos que parecem a mesma. Isto levou seis meses. J. Lord teve que pedir duas vezes autorização à sua revista para permanecer em Paris. Este quadro ai acima é uma das inúmeras variações... ao infinito.
Como se livrar do Giacometti que me habita? Talvez escrevendo? Talvez. Não é preciso. Seguro? Nem pensar. Mas escrever é arriscar-se. Na vida. Então, como dizia Lacan, sobre a cena do mundo (de Alberto Giacometti) eu avanço. Não quero mais me livrar dele. Que ele habite minhas palavras-sombra.
Lord, James. Um retrato de Giacometti. Iluminuras
Genet, J. O ateliê de Giacometti. Cosac & Naify
5 comentários:
registrar é um perigo. o que a gente escreve torna-se (inquestionavelmente) real.
Que bom não poder dar-se por acabado. São nossa infinitudes que nos fazem querer ficar por aqui, e transmutar sempre que possível.
Abçs!
A incompletude de nossas vidas passa por tanta coisa...
beijo grande Carlos Eduardo
Anne
Olá Carlos,
Bom encontrar teu blog, entrelaçando mundos.
Também adoro Giacometti!
Te enviarei um email sobre o documentário.
Bjs.
Confesso envergonhada que não conhecia o artista. No entanto, fiquei encantada com as esculturas e com o texto.
Obrigada pela referência.
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