segunda-feira, 30 de julho de 2012

Minhas palavras não caem do céu


Marc Chagall


Minhas palavras não caem do céu.
Minhas palavras nascem entre musgos e terra preta.
Não é matéria comestível, mas dela me alimento todos os dias.
Há orgulho, pois são minhas. Há tristeza, pois mal as escrevo e outros a levam em seus olhos.

Minhas palavras não caem dos céus.
Brotam dos horizontes.
Há alegria, pois meus dentes as mastigam sem purificá-las.
São o que são. Corto, retifico-as, degrado, amarro-as em feixes de pensamento e as coloco nas asas dos meus sonhos.

Minhas palavras não caem do céu.
Singram mares bravios. Cheios de ondulações nas estrofes.
Há tesão, pois elas me excitam. Rasgo o véu e desvirgino suas métricas. O suor entre o lápis e o papel enruga os caminhos da leitura.

Minhas palavras não caem do céu.
Então por que você não as ampara em teus olhos? Acolha o que de mim transborda?
Porque minhas palavras só podem brotar para você.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Nuvens de silêncio




Caminhar em silêncio
escutando os passos do coração
é como estar sonolento para as nuvens.
Uma nuvem é uma parte do céu que se condensou.
Acaricio um pensamento-passarinho: ele voa. 
O passo é um pé que se antepõe ao futuro.
Outra nuvem passa: silenciosa como uma partitura numa estante.
A orquestra ingressa ao palco. São pessoas comuns que me atravessam cantando com seus olhares apressados a vida"andante".
Existem estrelas matutinas? E sorrio deambulante com minha parvice.
Pois onde já se viu, seu Carlos, estrelas na fila de um supermercado? Elas só surgem quando o dia adormece.
Respiro fundo. Sei que minhas mãos tocam coisas que ninguém quer ver. Uma criança-nuvem suplica-me sentada ao rés do chão, com seus olhinhos assustados, por uma ternura qualquer. A vida dói descompassada.
Os olhos já não podem ser os mesmos. A criança dorme de olhos abertos. Dorme acordada em sua fome, em sua desnutrição biáfrica. Recolho os passos ao coração. Estou tonto e a vontade é indagar de onde surgem as pessoas invisíveis. Por que elas se tornaram assim?
Meu corpo acaricia coisas invisíveis.
Minhas mãos não foram feitas só para luvas insensíveis.
Nas extremidades de mim mora um ser que transborda. E é deste transbordamento que é feito o que realmente sou.
E caminho. E o silêncio do coração nunca foi tão gritante.
Outra nuvem passa. Há céu em mim.